por Carolina Mennocchi e Gisele Milani
Vários pensadores contemporâneos têm se debruçado sobre as questões do mundo atual, e todos convergem no sentido de que seguimos cada vez mais circunscritos em um mundo automatizado, sequencial e veloz. A lógica produtiva exige pouco tempo para gerarmos questionamentos, hipóteses, conflitos e, por consequência, muita informação e pouco conhecimento. É urgente sair desse olhar seccionado e partir em busca da fricção, do atrito, do afetar e ser afetado.
Ruído, sílaba, eco, voz, silêncio, afeto e encontro: são as p a l a v r a s – p a i s a g e n s que norteiam todo o nosso pensamento, e é aí que entram as intencionalidades do encontro entre as linguagens e por onde o pensamento criativo e contemplativo se torna uma realidade. Instantes sonoros e literários: A música e a literatura ampliando as possibilidades de apreciação estética cria um território de fronteiras tênues que oferece aos participantes alternativas para habitar os espaços educativos de forma mais criativa, ousada e autoral. Uma experiência que coloca a s a l a d e a u l a c o m o u m lu g a r d e i n v e n ç ã o .
Para a condução do processo, a postura de escuta ativa por parte das mediadoras se faz fundamental. O aprendizado é sempre social. Sabemos que o outro pode surpreender, enriquecer ou desestabilizar produtivamente nossas convicções e isso abre portais para que novas significações se entrelacem. Neste contexto, Cecilia Bajour atesta: “construir significados com outros sem precisar concluí-los é condição fundamental da escuta, e isso supõe a consciência de que a construção de sentidos nunca é um ato meramente individual” (BAJOUR, 2012, p.25).
Sustentado pelo pensamento rizomático da cartografia aplicada à educação, a tessitura dos dois encontros é estruturada alinhando as perspectivas teóricas dos filósofos e de pensadores das linguagens literárias e musicais com a criação de uma ambiência coletiva feita da diversidade de um grupo desconhecido, que chega trazendo memórias e subjetividades singulares.
A nossa conversa acontece a partir de provocações e exercícios de leitura compartilhada, de escrita criativa, investigações de sonoridades e apreciação musical.
A observação atenta entre os ditos e os não-ditos de uma obra literária, assim como a percepção do som e do silêncio de uma arquitetura musical contribui para aprofundar a discussão de uma apreciação estética efetiva. As situações reflexivas acontecem quando os participantes se confrontam com textos desconhecidos, saberes dormentes e latências de um corpo cantante. Para que isso aconteça, diante deste mundo saturado, tem que se tornar experiência.
“A experiência, a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm: requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar, e escutar mais devagar, parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a ação e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar os outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço.” (LARROSA, 2014, p. 23)
O chamado para esta vivência está na força de um d e s l o c a m e n t o corajoso de r e i n v e n ç ã o para as práticas de atuação no ambiente escolar.
Ainda é pouco comum relacionarmos a docência com o campo de criação. Entretanto, ser educador, por essência, é criar oportunidades de aprendizado original, é criar frestas para o mundo interior e exterior das crianças e, para isso, é necessário estar disponível para experimentar em um mundo de tantas incertezas. Saramago atesta: “Se não sais de ti, não chegas a saber quem és.”
Referências bibliográficas
LARROSA, Jorge – Tremores-Escritos sobre experiência. 2014. Ed Autêntica , São Paulo.
SARAMAGO, José – O conto da ilha desconhecida. Ed Companhia das Letras, São Paulo.
BAJOUR, Cecília – Ouvir nas entrelinhas – O valor da escuta nas práticas de leitura. 2012. Ed Pulo do gato. São Paulo
CHUN HAN, Byung – “Vita Contemplativa Ou sobre a inatividade”. 2023, Ed Vozes. São Paulo.
PICCHIONI, Marta – “Implicações sobre o método cartográfico para a educação: a sala de aula como lugar de invenção”. Artigo para Veras: revista acadêmica de educação do Instituto Vera Cruz.
Programação de Inverno 2024 no Centro de Formação da Vila
Veja abaixo o link de alguns cursos e acompanhe as postagens no
Blog do Centro de Formação da Vila.
Como criar ambientes alfabetizadores potentes
Educação antirracista nos anos iniciais do Ensino Fundamental
Currículo e avaliação formativa nas Ciências da Natureza
Discurso argumentativo no Ensino Fundamental II: leitura, escrita e oralidade
Os jogos favorecem as aprendizagens matemáticas. Sempre? Como?
STEAM e Maker: reflexões e propostas para engajar estudantes ativos
Aprender a escrever escrevendo. Propostas didáticas para a formação de escritores competentes
Caminhos na leitura de livros ilustrados – da estética literária à perspectiva antirracista
Os nomes próprios e as palavras de referência no processo de alfabetização
Leitura literária nas aulas de inglês: língua e cultura na construção de um currículo decolonial
Atividades diversificadas: avaliação e planejamento em salas de alfabetização
Educação Digital: riscos, desafios e potencialidade pedagógica da IA na sala de aula
Minha turma é difícil! O que fazer? Ferramentas didáticas e reflexões teóricas
Rotinas de Pensamento: caminhos para tornar a aprendizagem visível
Descolonizando o Ensino: Integração da Legislação Educacional e Práticas Pedagógicas Insurgentes