por Beatriz Mugnani e Caroline Ferraz
Aprender a ler e a escrever é um desafio complexo, duradouro e singular para cada criança ao adentrar nos primeiros anos do Ensino Fundamental 1, assim como aprender a ler e a escrever é um marco de crescimento e de cidadania dos estudantes. Ser professor e professora dos anos iniciais desta etapa da escolarização é entrar em contato diário com crianças que têm saberes e experiências muito diversas sobre as práticas de leitura e escrita: crianças já com hábitos leitores estabelecidos, crianças que não se envolvem tanto quando são convidadas a refletir sobre o mundo letrado, alunos e alunas que ingressam numa nova escola e que viveram outras experiências escolares em relação às práticas de leitura e escrita, e crianças que se aproximam dos comportamentos leitores e escritores com mais confiança.
Ou seja, podemos listar aqui inúmeros desafios que um professor alfabetizador precisa estar preparado para lidar. Mas, como equilibrar tantos pratos? Como considerar toda a diversidade de saberes e vivências dos alunos e alunas, dentro de um tempo didático limitado? Como considerar toda a diversidade se os objetivos de aprendizagem são os mesmos para todos e todas? Como considerar toda a diversidade de um grupo dentro dos projetos e sequências didáticas que são planejados anteriormente ao início das aulas, quando ainda não conhecemos nossos alunos e alunas?
Flavia Terigi (2010), apresenta a ideia de que tudo dentro da escola possui um sistema de ordenação do tempo, que estrutura nossos saberes, nossas definições de conteúdo, os ritmos de aprendizagem e até os ritmos de avaliação. Essa forma de ordenação do tempo recai sobre a forma como ensinamos: existe apenas um tempo para todos os estudantes, que pauta um único ritmo e uma aprendizagem linear. Flavia Terigi define esse conceito como aprendizagens monocrônicas.
A autora nos faz refletir sobre como um sistema que é pensado de maneira única pode atender uma pluralidade de saberes dentro de um grupo de estudantes e como, em nossa prática de sala de aula, afirmamos a diversidade como valor intrínseco à cidadania que almejamos de nossos alunos e alunas. Dada essa ambivalência, quais são os esforços que as instituições de ensino, às formações docentes (iniciais e continuadas) e nós, professores, fazemos para tornar o trabalho com a diversidade viável dentro das escolas? Talvez não tenhamos respostas claras para isso, mas com certeza, um caminho possível é analisar nossas práticas em sala de aula e a partir daí, repensar nossa forma de abraçar a diversidade de nossas crianças.
Flavia Terigi (2010) também nos ajuda a refletir sobre quais caminhos seguir: para a autora, é necessário que comecemos a desenvolver um saber pedagógico e, mais especificamente, um saber didático, para termos a capacidade de não desenvolver uma aprendizagem monocrônica, mas sim distintas cronologias de aprendizagem. Precisaremos, portanto, discutir quais são as condições didáticas para levar diferentes cronologias de aprendizagem em consideração: seleção de eixos temáticos que permitam distintos níveis de aprendizagem, para isso eles precisam ser potentes e envolver a todos e todas; traduzir esses diferentes níveis de aprendizagem de maneira concreta em nossos planejamentos; propor atividades de ensino que respondam a estruturas temporais diferentes; levar em consideração momentos de organização, em que trazemos a memória de estudo, uma construção conjunta dos saberes; formação dos alunos para o trabalho autônomo e o trabalho em equipes; e as intervenções que realizamos diretamente com os alunos e alunas para avançar em seus conhecimentos em relação à leitura e a escrita.
Fazer isso individualmente é impossível, sabemos disso. Por isso, a troca entre professores, as reuniões pedagógicas, as reuniões individuais ou de equipe com orientadores e coordenadores e a formação continuada se tornam tão essenciais para viabilizar o trabalho com diferentes cronologias de aprendizagem. Convidamos, então, todas e todos para refletirmos e trocar experiências para sempre avançarmos em direção à uma prática que atende a diversidade de saberes, culturas e experiências dentro da sala de aula.
TERIGI, F. Las cronologías de aprendizaje: un concepto para pensar las trayectorias escolares. 2010.
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