Brasil Império

Um pouco de história da docência no Brasil – Brasil Império

Antes de o Brasil se tornar um Estado independente houve um evento que teve impacto na educação: a vinda da Corte Portuguesa, em 1808.

Brasil Império

Dom João e um grupo de cerca de 15 mil pessoas – entre nobres, militares, profissionais liberais e serviçais, saíram de Portugal fugindo de Napoleão Bonaparte e encontraram um Brasil que faltava tudo: hospitais, bancos, fábricas, tribunais…. e, claro, escolas.

Mas D. João não estava interessado na educação básica e sim em formar a aristocracia. Embora não tenham sido criadas Universidades, o que se gestou neste período foi o que viria ser o Ensino Superior. Assim, tanto o ensino primário quanto o secundário, seguiram relegados a segundo plano e sem melhorar suas condições.

Em 1822, após a declaração de independência, o Brasil passava por dificuldades econômicas e o governo imperial não parecia muito interessado nos problemas da educação.

Em 1924, foi outorgada nossa primeira Constituição (“outorgada” e não “promulgada” – mas isso é assunto para outro post) e nela havia menção expressa a “instrução primária e gratuita para todos os cidadãos”.

Em 1826 os parlamentares debateram intensamente a educação para, em 1827, publicar a primeira lei brasileira (e não portuguesa) sobre o assunto. Adivinhem a data em que foi publicada? 15 de outubro.

Esta norma tratou de várias questões relevantes para educação e seu impacto foi duradouro.

LEI DE 15 DE OUTUBRO DE 1827
Manda crear escolas de primeiras letras em todas as cidades, villas e logares mais populosos do Imperio.

Dom Pedro, por Graça de Deus, e unanime acclamação dos povos, Imperador Constitucional, e Defensor Perpetuo do Brazil: Fazemos saber a todos os nossos subditos, que a Assembléa Geral decretou, e nós queremos a lei seguinte:

Art 1º Em todas as cidades, villas e logares mais populosos, haverão as escolas de primeiras letras que forem necessarias.

Art 2º Os Presidentes das provincias, em Conselho e com audiencia das respectivas Camaras, emquanto não tiverem exercicio os Conselhos geraes, maracarão o numero e localidades das escolas, podendo extinguir as que existem em logares pouco populosos e remover os Professores dellas para as que se crearem, onde mais aproveitem, dando conta á Assembléa Geral para final resolução.

Art 3º Os Presidentes, em Conselho, taxarão inteiramente os ordenados dos Professores, regulando-os de 2004000 a 500$000 annuaes: com attenção ás circumstancias da população e carestia dos logares, e o farão presente á Assembléa Geral para a approvação.

Art 4º As escolas serão de ensino mutuo nas capitaes das provincias; e o serão tambem nas cidades, villas e logares populosos dellas, em que fór possivel estabelecerem-se.

[…]

Reafirma a diretriz de Pombal em busca do fortalecimento da escola pública mas, por outro lado, empurra a atribuição de remunerar os mestres às Províncias, e quem disse que as Províncias tinham recurso para isso?

Começa aí uma das questões basilares de nosso sistema de educação pública básica: quem paga a conta?

Também, no artigo 5º da lei, há, pela primeira vez, a menção à necessidade de formação do professorado: [os professores] que não tiverem a necessaria instrucção deste ensino, irão instruir-se em curto prazo e á custa dos seus ordenados nas escolas das capitaes. Ou seja: cada um que se virasse para aprender como ensinar.

Discriminação das mulheres

Há, nesta lei também, uma explícita discriminação das mulheres. Às meninas não era dado o direito de aprender disciplinas entendidas como “mais racionais”, com a exclusão das noções de geometria e limitando a instrucção da arithmetica só as suas quatro operações, ensinarão tambem as prendas que servem á economia domestica (artigo 12).

Sobre a remuneração, surpreendentemente, a lei, em seu artigo 13, estabelece que deve ser a mesma para mestres e mestras mas…. um artigo decreto de 27 de agosto de 1831 estipulava que os salários previsto em lei somente fossem recebidos por professores habilitados nas matérias de ensino indicadas na Lei de 1827, por concurso e as províncias podiam de contratar candidatos reprovados se não houvesse aprovados com a condição de pagá-los com salários menores. Ora, não havendo escolas de formação para as meninas e não sendo ministradas todas as matérias nas escolas de primeiras letras femininas, podemos entrever que as moças eram possivelmente as candidatas contratadas ganhando menos.

Então se pode deduzir que as moças, que não tinham como aprender todas as matérias, não se saiam bem nos concursos e, por consequência, acabavam sendo contratadas por salários mais baixos.

Vejam este fato curioso, relatado por Hilsdorf e que tiramos do artigo citado abaixo* sobre a professora, que passou no concurso verificou-se que ela vivia com ‘honestidade e bom comportamento público’, foi nomeada para o cargo mas não ensinava prendas domésticas às meninas em suas aulas. As autoridades a questionaram e, ainda assim, seguiu até a aposentadoria sem ensinar as prendas domésticas às moças. Em 1829, ela foi denunciada na Câmara Municipal por outra professora porque “recebia 76$800 réis anuais para administrar e dar educação econômica e religiosa, ensinar a ler, escrever, contar, crivos, bordados, fiar e coser, fazer flores e pussá”, enquanto Benedita recebia 300$000 réis anuais para ensinar a ler, escrever, e tinha férias todos os dias santos e as 5as. feiras (1998, p.521 e 522).

Mas ela – Benedita – havia passado em concurso perante o Presidente da província e por isso, recebia integralmente os vencimentos estipulados em lei, apesar de não cumpri-la na íntegra; a outra professora recebia bem menos do que a metade. Quantas outras candidatas teriam sido capazes de passar no concurso? Quantas seriam contratadas recebendo metade ou menos durante a vigência destas leis?
(Mais sobre a história de Benedita, você encontra aqui)

Resultados concretos no Brasil Império

Além de começar a discriminação explícita das mulheres, quais foram os resultados concretos da promulgação dessa lei?

O Ministro Lino Coutinho, que embora fizesse parte do governo, se opunha a Dom Pedro, em seus relatórios de 1831-36 sobre a implantação da Lei de 1827 denunciou o mau estado da educação no país.

Argumentava que, apesar dos esforços e gastos do Estado no estabelecimento e ampliação do ensino elementar, a responsabilidade pela precariedade do ensino elementar era das municipalidades pela ineficiente administração e fiscalização, bem como culpava os professores por desleixo e os alunos por vadiagem. Admitia, no entanto, que houve abandono do poder público quanto ao provimento dos recursos materiais, como os edifícios públicos previstos pela lei, livros didáticos e outros itens. Também apontava o baixo salário dos professores; a excessiva complexidade dos conhecimentos exigidos pela lei e que dificultavam o provimento de professores; e a inadequação do método adotado em vista das condições particulares do país.

Não íamos bem.
Surge no horizonte, então, a Escola Normal.


Escrito por Claudia Aratangy

Fiquem ligados e não percam as próximas publicações sobre a história da docência no Brasil.

Aproveite para ler o início da história da docência no Brasil aqui:
Parte 1 – Ratio Studiorum
Parte 2 – Marquês de Pombal

 

Fontes consultadas:

Lei de 15 de outubro de 1827;

* Um olhar na História: a mulher na escola (Brasil: 1549 – 1910);

Para além das prendas domésticas: a trajetória da mestra Benedita da Trindade no magistério feminino paulista;

O Império e as primeiras tentativas de organização da educação nacional (1822-1889).

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