blog-cidadania-internacional

Cidadania internacional, uma proposta formativa

A BNCC (Base Nacional Comum Curricular) propõe uma mudança em relação aos parâmetros do ensino de Inglês anteriores: a substituição do componente curricular Língua Estrangeira Moderna por Língua Inglesa. Vale ressaltar que as diretrizes mantém o destaque para o valor das línguas estrangeiras como um todo, recomendando a inclusão de outros idiomas no caso de comunidades compostas por muitos imigrantes com uma mesma língua materna e em regiões de fronteiras, enfatizando também a relevância do aprendizado das línguas de povos originários brasileiros em seus contextos e territórios.

Qual o papel da língua inglesa na formação dos estudantes?

Feitas tais ressalvas, cabe a pergunta: por que a mudança? Qual é o papel da língua inglesa e qual o propósito formativo desse componente curricular?

Aprender a língua inglesa propicia a criação de novas formas de engajamento e participação dos alunos em um mundo social cada vez mais globalizado e plural, em que as fronteiras entre países e interesses pessoais, locais, regionais, nacionais e transnacionais estão cada vez mais difusas e contraditórias. Assim, o estudo da língua inglesa pode possibilitar a todos o acesso aos saberes linguísticos necessários para engajamento e participação, contribuindo para o agenciamento crítico dos estudantes e para o exercício da cidadania ativa, além de ampliar as possibilidades de interação e mobilidade, abrindo novos percursos de construção de conhecimentos e de continuidade nos estudos. (BNCC, pág. 239)

A discussão hoje se dá em torno do papel da escola na formação de estudantes. Sua função passa a ser preparar as crianças e os jovens para compreender, interagir e atuar criticamente neste mundo de fronteiras tênues e em constante transformação. Espera-se que a escola possibilite às novas gerações se informar e interagir com a produção de conhecimento do mundo inteiro, ampliando suas possibilidades de compreensão e atuação na sociedade.

A língua inglesa, hoje língua franca, abre portas para essa interação com a produção de todas as áreas do conhecimento: científica, econômica, cultural e assim por diante, de qualquer lugar do planeta. Sendo assim, a proficiência no idioma torna-se, sem dúvida, peça fundamental da formação a ser oferecida pela escola.

Cidadania internacional

Mas não é suficiente saber as palavras e regras estruturais da língua para ser capaz de exercer essa cidadania ativa mencionada na BNCC. Cito um exemplo do livro Americanah, da escritora Chimamanda Ngozi Adichie. Em certo momento, a personagem se muda da Nigéria para os Estados Unidos e, ao chegar lá, não consegue compreender certas situações cotidianas, como quando ela tropeça na rua, cai e as pessoas se aproximam perguntando: “Você está bem?”. Para ela, essa pergunta chega a ser ofensiva. Ela pensa: “Não vê que acabei de cair e me machucar? Como pode me perguntar se estou bem?”. Ou seja, ela entende as palavras, mas não consegue entender o sentido do que estão dizendo, porquê, para quê. Esse exemplo deixa claro que não basta saber muitas palavras ou construir frases corretas. Para a comunicação acontecer, é preciso compreender quem é o outro, de onde ele fala, como demonstra sua intenção e tantos outros saberes sobre contexto, costumes e culturas.

Research Schools International

Um estudo da Research Schools International, organização de pesquisas em educação de Harvard, definiu cinco indicadores que revelam se o projeto formativo das escolas propicia o desenvolvimento de competências globais[1]

1. Volunteering services to help people in the wider community: Volunteering was significantly correlated with engagement with others regarding global issues, global mindedness, openness to diversity, interest in other cultures, adaptability, awareness of global issues, respect, and self-efficacy.
2. Participating in events celebrating cultural diversity throughout the school year: Cultural diversity events were significantly correlated with building the following competencies: engagement with others regarding global issues, attitude towards immigrants, openness to diversity, interest in other cultures, global mindedness, respect, adaptability, and self-efficacy.
3. Learning how people from different cultures can have different perspectives on some issues: Learning about other cultures and perspectives was significantly correlated with openness to diversity, interest in other cultures, attitudes towards immigrants, self-efficacy, engagement with others, and awareness of global issues.
4. Participating in classroom discussions about world events: Discussions about world events was significantly correlated with self-efficacy, awareness of global issues, openness to diversity, adaptability, and global mindedness.
5. Learning to solve conflicts: Conflict solution was significantly correlated with adaptability, perspective taking, openness to diversity, intercultural communication, respect, global mindedness, attitudes towards immigrants, and awareness of global issues.

Ao ler esses indicadores, percebe-se a relevância do conhecimento linguístico entendido tanto como conhecimento da forma de se comunicar: léxico, gramática, textos; como conhecimento de todo o contexto em que a comunicação acontece: a forma pela qual pessoas de diferentes culturas têm perspectivas distintas sobre um mesmo tema, discussões sobre eventos globais, atitudes compreensivas em relação à imigração e à diversidade etc.

Cidadania internacional como uma experiência prática

Fica claro, então, que o projeto de internacionalização nas escolas precisa dar conta da proficiência em Inglês – língua franca – e também da formação para a cidadania internacional. Para colocar isso em prática, é necessário organizar situações de aprendizagem orientadas para o desenvolvimento de todos esses saberes. Colocar os alunos e alunas para conviver e experimentar situações fora das paredes da escola e do país.

Um excelente exemplo dessa prática aconteceu em uma sequência com os estudantes do 7º ano da Escola da Vila, em São Paulo. A professora, Andreia A. Silva, conduzia a leitura da biografia de Mahatma Gandhi com seus estudantes. Eles demonstraram estranhamento a muitas das informações sobre eventos de sua vida, na Índia. A professora então ajudou-os a organizar suas perguntas e promoveu um encontro virtual com um indiano, que foi entrevistado pelos alunos e alunas respondendo perguntas sobre as tradições do casamento, como se davam nomes aos filhos, sobre as oportunidades de estudo e a divisão da sociedade da Índia.

Certamente, todos e todas saíram da sequência didática com um repertório ampliado de vocabulário e estruturas, bem como aprenderam a se preparar para uma entrevista, desenvolveram a capacidade e estratégias para compreender um input verbal autêntico e, ao mesmo tempo, ampliaram sua visão de mundo ao entender quão diferente é a organização social e os costumes de outro país em relação às referências que conheciam.

Vivências amplificadas por meio de literária diversa

Além das situações planejadas e promovidas dentro da escola, as vivências podem e devem ser amplificadas por meio da leitura literária de autores de diferentes países e/ou que retratam realidades diversas. Também as viagens internacionais são momentos únicos para que as crianças e os jovens convivam com as diferenças e alarguem sua visão de mundo. Finalmente, a tecnologia permite fazer viagens virtuais e trocar com interlocutores de todos os cantos do planeta.

As sugestões estão aí. Agora é com vocês, professores e professoras, gestores e gestoras: vamos formar nossos estudantes para que sejam agentes conscientes da transformação deste mundo.

Escrito por Sandra Baumel Durazzo – Assessora de internacionalização da Bahema Educação

Confira outros textos em nosso Blog.

 

______________
[1] Shanker, A. Hinton, C. & Cheung, L. (2020). Developing Students Global Competence: An International Research Study. Round Square.

Boudreau, E. (2020, January 26). Nurturing a global mind. Harvard Graduate School of Education. https://www.gse.harvard.edu/news/uk/20/01/nurturing-global-mind

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *