Por Fermín Damirdjian e Cristina Maher
Em junho de 2019, um estudo publicado na revista da Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo (Fapesp) mapeou a distribuição de diagnósticos de depressão em jovens ao redor do mundo, a partir de ocorrências de suicídio nos 5 continentes. O aumento exponencial dessa patologia não tinha um motivo único, mas vários, de naturezas muito diferentes: desde a profusão descuidada de diagnósticos até contingências sociais, tais como vida afetiva, uso de mídias digitais, redução na prática de esportes e muitos outros fatores.
Naquele ano, a publicação foi feita por pessoas que não tinham a menor suspeita da pandemia que assolaria nosso planeta seis meses depois. E já trazia elementos de reflexão sobre a juventude atual.
Hoje, quando pensamos nesse assunto, colocamos na conta também os danos causados pela COVID-19, pois sua incidência sobre alterações em nosso modo de vida são inegáveis. Mas, antes dela, também precisamos considerar elementos estruturais de nossa cultura, que parece ser tão mutante quanto um vírus típico de um mundo globalizado.
A liquidez deixou de ser um termo do mundo financeiro ou da observação física da natureza, e migrou para a sociologia, com as contribuições determinantes de Zygmunt Bauman (1999) ao descrever a vida pós-moderna. A ansiedade e o cansaço, resultantes da intensificação das metas de produtividade associadas à flexibilização da organização do tempo e das relações de trabalho, revelam-se as condições compartilhadas por muitos de nós.
Enxergamo-nos completamente autônomos, capazes de determinar nossos destinos de acordo única e exclusivamente com nossas vontades. A quebra de tradições virou um lugar comum, e, em muitos casos, recorrer a elas virou bandeiras de plataformas políticas radicais.
As experiências coletivas esvaem-se em um mundo que prega a supremacia dos desejos individuais. A tecnologia mudou em uma espécie de progressão geométrica, e não foi difícil fazer disso uma analogia para explicar as mudanças de hábitos na vida de cada um. Não à toa, o filósofo sul-coreano Byung Chul Han compara smartphones a rosários: vivemos sob a experiência do tempo regido por esses pequenos objetos portáteis, que nos proporcionam experiências táteis confessionais e, de certo modo, fundamentam nossas identidades.
Onde ficam os jovens em tudo isso? E a função da família? E o papel da escola?
Quem tiver as respostas para essas perguntas estará, supomos, manipulando e simplificando meia dúzia de informações para criar asserções fictícias e que, de alguma forma, transmitem certo alívio para nossos pobres cérebros, carentes de explicações diante de um mundo tão mutante.
Não há, contudo, como escapar dessas questões. Se queremos atuar na formação de pessoas capazes de construir – para si mesmos, para seu entorno e para mundo – projetos mais sólidos e significativos, precisamos olhar de frente para as transformações pelas quais a instituição escolar deve passar. Essa é uma pequena certeza em um mundo tão incerto. Já é bom um começo.
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