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Por que prestar atenção nos corpos das crianças e dos jovens, agora mais do que nunca?

O corpo sempre teve um papel muito importante na escola. Para além da necessidade de seu desenvolvimento, como parte fundamental do processo de formação integral, observar os movimentos e os gestos é uma maneira privilegiada de compreender o que se passa com os alunos e alunas. A agitação, a desorganização postural, a timidez e a dificuldade de concentração, por exemplo, são indícios valiosos sobre as demandas de cada indivíduo e do grupo como um todo.

No contexto em que nos encontramos, contudo, o corpo se revela um elemento ainda mais significativo para perceber os estudantes e seus atuais desafios. Como mostrou André Trindade, terapeuta especializado na educação corporal de crianças e jovens, o longo período de reclusão social que vivemos em função da pandemia trouxe inumeráveis consequências emocionais e psíquicas, inevitavelmente relacionadas ao corpo.

Para grande parte das pessoas, ficar em casa significou esquecer o próprio corpo: menos movimentos, menos exercícios, menos possibilidades de interação com o ambiente, menos natureza, menos sol e, por outro lado, muito mais tempo na frente das telas, quase sempre na posição sentada. Se para os adultos essas condições já foram bastante duras, para os mais novos foram implacáveis, uma vez que os estímulos físicos são alguns dos principais vetores do desenvolvimento nesta fase, basilar para a formação humana.

Portanto, neste momento em que escolas e famílias estão precisando de instrumentos para pensar o bem e o mal-estar das novas gerações, prestar atenção no corpo é indispensável. Segundo André, o tempo vivido em isolamento só ajudou a escancarar algo que sempre existiu: o protagonismo do corpo quando o assunto é infância e adolescência e o quanto o negligenciamos, seja dentro ou fora do ambiente escolar.

Expansão da capacidade intelectual dos pequenos

As dimensões comportamentais, sociais e culturais da corporalidade são imprescindíveis para lidarmos com a presente preocupação, cada vez maior, sobre o aumento de casos de depressão, ansiedade, pânico, bullying e até mesmo de suicídio nas escolas, amplamente noticiado pela mídia e profundamente conhecido por educadores, educadoras e familiares. Estamos sentindo, agora com mais força, o impacto do que aconteceu nos últimos anos.

Até pouco tempo atrás, em uma turma de mais ou menos 30 estudantes, era comum que 5 estivessem enfrentando algum tipo de dificuldade de desenvolvimento, de aprendizagem ou de sofrimento psíquico. Hoje, parece que esse número se inverteu, passando a ser a regra (não somente entre as crianças e jovens, mas também entre os adultos que estão ao seu redor). A volta do convívio escolar impôs a reorganização de muitas dinâmicas sociais, que ainda estão em construção – tarefa que precisa ser impreterivelmente coletiva.

Para encarar os efeitos desse fenômeno, é necessário notar como eles afetaram e afetam cada faixa etária. Na leitura de André, pode-se dizer que todos tiveram as possibilidades de desenvolvimento diminuídas, porém de modos distintos.

Os recém-nascidos, por exemplo, perderam muitos incentivos aos movimentos de torção, que são importantes não apenas em termos motores, fazendo-os sair de uma mobilidade restrita ao eixo central e verticalizado e ganhar a percepção da lateralidade, mas também de como essa mobilização está vinculada à expansão da capacidade intelectual. Ao torcer o tronco em torno de si mesmo, o bebê passa a prestar atenção no que acontece à sua volta, interage com o meio, encontra-se com o diferente e ganha a capacidade de desenvolver conceitos fora da chave dual e binária do bom/ruim, certo/errado etc., identificando nuances.

Dinâmicas sociais no desenvolvimento dos jovens

Mesmo entre as crianças um pouco mais velhas, os quase dois anos em casa (em alguns casos, até mais) limitaram igualmente esse tipo de movimentação, fazendo com que elas ficassem mais rígidas em seus próprios eixos. Não só pelo tempo passado na cama, no sofá e na cadeira, entre quatro paredes, mas também porque o foco na tela, em especial do celular, restringe o olhar a um ponto único, sem horizonte e visão periférica. Com isso, acentuaram-se as perspectivas individuais e reduziram-se as oportunidades de expandir os sentidos, isto é, de ver e interagir com o que não está imediatamente à frente.

Quando as escolas reabriram novamente, os cuidados estavam voltados, em sua maioria, à recuperação das aprendizagens perdidas nesse meio tempo. Como resgatar os conteúdos atrasados era o grande desafio naquele momento. Passados alguns meses, percebemos que tão importante quanto as matérias escolares é o foco na recuperação de outros tipos de aprendizagens e experiências, as quais os jovens alunos e alunas também foram privados.

Como destacou André, é preciso mexer mais os corpos, despertar os sentidos, sair das telas e interagir! Sem tratar do corpo, não será possível melhorar a concentração das crianças, diminuir a ansiedade dos jovens, alargar as relações e aumentar o bem-estar.

E lidar com os problemas e dores decorrentes desta falta de cuidado com o corpo é uma tarefa social compartilhada entre famílias e escolas. Os adultos precisam de ferramentas para mediar os conflitos. De escuta e de diálogo, de tempo e de cuidado, mas também de repertório para fazer propostas que incentivem a convivência e que motivem os corpos a se mexerem, provocando interesse sobre a criação de novas e a retomada de velhas possibilidades corporais.

Pausa entre as tarefas

Nesse sentido, André deixa a provocação: será que não temos nem 10 minutos de manhã para espreguiçar o corpo com os nossos filhos e filhas? Será que as escolas não poderiam reservar 15 minutos diários para despertar os sentidos antes de pedir que os alunos e alunas se sentem e prestem atenção? Será que não precisamos de mais momentos para conversar e falar sobre nossas dificuldades? O que pode ser feito para que a rotina permita pequenas inserções e respiros entre lições, tarefas e obrigações?

 

Escrito por Bianca Laurino – Equipe de Comunicação da Bahema Educação
Os textos aqui publicados não refletem, necessariamente, a opinião do Centro de Formação.

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