skate pode ensinar

O que o skate pode ensinar às escolas?

No final de setembro, a cidade de São Paulo sediou o SLS (Street League Skateboarding) World Tour – um evento competitivo, parte do circuito mundial, que começou em Los Angeles, passou por Londres e terminou por aqui, no Pavilhão do Anhembi, com um público de cerca de 8 mil pessoas.

Para quem não sabe, o skate é filho do surf. Nasceu quando os surfistas californianos, entediados com a falta de ondas, criaram um novo brinquedinho para treinar no seco. E aí, a cria ganhou vida própria, se tornando um esporte praticado por milhões de pessoas mundo afora. No Brasil, pesquisa de 2016, descobriu que existem cerca de 8,5 milhões de skatistas no país espalhados por todas as regiões, presentes em todas as classes sociais, mas com predomínio das classes C, D e E, que representam 74% dos praticantes. É um esporte democrático.

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E, diferente do que se possa pensar, o skate não é um esporte. São várias modalidades, às vezes muito diferentes entre si: longboard, downhill slide, mini-rampa, mega-rampa, bowl, free style, entre outros, que variam desde o tipo do shape (peça de madeira) até a natureza do percurso. A competição que aconteceu em São Paulo foi de uma modalidade chamada street e tem este nome pois a prática acontece na rua – em escadas, bancos de concreto, corrimões, rampinhas de acesso e outros obstáculos que nela possam ser encontrados. Além disso, também fazem parte dessa modalidade as chamadas manobras: ollie, nollie, flip, heelflip, varial e mais algumas dúzias de outros movimentos.

Mas… o que a escola pode aprender com o skate? Diferente do que pode parecer, esta postagem não é sobre como o skate pode ser um esporte adequado para incluir nas aulas de Educação Física – até é – mas é sobre algumas das aprendizagens que esta modalidade propicia para seus praticantes – a grande maioria de jovens, meninos, particularmente na modalidade street – e que, talvez, possa nos ajudar a enxergar os jovens de outro ângulo.

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1. Regras não escritas, convívio pacífico

As praças, pistas ou mesmo ruas que os skatistas elegem como seus espaços de prática estão repletos de jovens que podem, ou não, se conhecer, que tem graus diferentes de habilidade, são de distintas faixas etárias e, em alguns casos, classes sociais. Quem observa de fora aquele monte de meninos indo e vindo em todas as direções, em velocidade, não pode deixar de ficar surpreso ao notar que não há acidentes embora não haja nenhum adulto no controle da situação. Parece o caos, mas há uma organização regida pela habilidade dos mais velhos e por algumas regras não escritas sobre quem tem prioridade.
Os mais experientes ficam atentos aos menos experientes, assim, por exemplo, quando um skate escapa e atrapalha a manobra que alguém estava prestes a realizar, não há xingamentos ou reclamações: todos sabem que é difícil mesmo acertar e aguarda, pacientemente, que o skate seja resgatado antes de seguir com seus planos. É um espaço em que agem com autonomia, com respeito às regras e às diferenças – sem que seja preciso lições de moral ou punições.

2. Perseverança, tolerância à frustração, aprendizagem com os erros

Acertar uma manobra de skate não é fácil. Algumas são extremamente difíceis. Às vezes, pode levar meses para que o praticante consiga realizar alguns movimentos. Mas lá ficam eles uma, duas, três, quatro, dez, trinta, cem tentativas…até acertar. Tentativas malfadadas que podem resultar em quedas, arranhões, skate pode ensinarquebra do shape ou, até, leves feridas na dignidade por ter se visto em alguma pose ridícula. Mas isso não tem problema: o que importa é seguir tentando e pedir para ser observado ou para alguém gravar de modo que possam descobrir o que precisam fazer de diferente.
Quando conseguem a manobra almejada, festejam como quem fez um gol e não se acomodam – sabem que é preciso praticar, praticar e praticar, para dominar o movimento e conseguir repeti-lo em outras condições de temperatura e pressão. Além disso, sabem que ao dominar o ollie, por exemplo, ele pode evoluir para um ollie 180 ou para um nollie. E seguem aprendendo.

3. Competição, colaboração e apreciação

Uma das coisas mais incríveis das competições de skate é a forma como adversários e torcida se comportam. Até mesmo em um campeonato internacional, como este que aconteceu em setembro em São Paulo. Embora a torcida vibrasse mais com os brasileiros e brasileiras que estavam brigando pelo título, qualquer manobra difícil que qualquer (qualquer mesmo) competidor acertasse, era aplaudida por todos. Por todos – inclusive pela maioria dos competidores. As tentativas mais audaciosas – como de Dashawn Jordan que foi para o tudo ou nada tentando subir um corrimão com o skate, em vez de fazer o óbvio, que é descer. Ele não conseguiu, mas foi aplaudidíssimo e o público soltou um “aaaaa” decepcionado por ele ter fracassado, ainda que seu acerto significasse uma pontuação mais alta que a do brasileiro que estava nas finais.

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O ponto alto da competição feminina foi quando Pâmela Rosa (BRA) fez uma manobra belíssima – a qual terminou festejando – que virou o jogo para ela de 2º para 1º lugar. Adivinha com quem ela foi comemorar? Com Rayssa Leal (uma personagem que vale outra postagem), justamente quem estava perdendo a colocação para ela! Foi de encher os olhos. Em que esporte “o fair play” chega a esse ponto? E o que nos mostra sobre a capacidade dos jovens de jogar justo, limpo, de admirar seus adversários, não apenas respeitá-los?

Que tal olhar os jovens pela lente do skate? Claro que a escola não é a rua, a pista ou a praça mas… será que não é possível apostar mais na autonomia deles, na capacidade de conviver, de ensinar e de aprender com os pares e com próprios erros, de perseverar, de ter objetivos, de admirar o jogo justo?

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Escrito por Claudia Aratangy

 

Fontes consultadas:

Datafolha atualiza para 8,5 milhões o número de skatistas no Brasil
Downhill, freestyle, megarampa e mais 7 modalidades de skate que você precisa conhecer
Manobras de Skate para Profissionais
SLS – Street League Skateboarding

1 comment

  1. Jackson

    Lindo texto ” O que o Skate poda ensinar às escolas!” de
    Claudia Aratangy! Realmente é essa minha impressão ao inserir e acompanhar meu filho “iniciante” nas pistas de Skate em São Paulo, primeiro uma pista de recreação do Sesc Campo Limpo e agora no Jockey na F. Morato. O texto é a real do que acontece na prática. Tanto que estou fortemente inclinado a entrar neste universo do Skate aos 55. Para sentir essa onda positiva. Parabéns Claudia!

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